Começou a circular em outubro a Revista Arteira 5
da EBP- SC, coordenada por Gresiela Nunes da Rosa.
Trata-se de uma publicação não temática que, em
suas diversas seções, conta com artigos de colegas da EBP e de diversas Escolas
da AMP.
Na seção política, três artigos marcam a
diferença entre a psicanálise e as abordagens terapêuticas, a partir da posição
ética do psicanalista e as preocupações com temas da contemporaneidade. Nora
Gonçalves, intitula seu artigo com a pergunta: A psicanálise, como ela pode converter-se numa força material, numa
força política? E responde que este propósito pode ser alcançado, na medida
em que consigamos introduzir no mundo as lógicas inventadas por Lacan, que
permitem um diferente modo de pensar, ajuizar, dizer e ler o que está escrito;
isto é, propõe a transposição em ato, dos efeitos adquiridos na clínica para a
realidade, como condição para que possam tornar-se necessários.
Eric Laurent mostra sua preocupação com as
pesquisas que visam localizar as causas do autismo e critica alguns tratamentos
propostos. Com Pesquisar e punir: a ética
hoje, o autor mostra que a busca da correlação entre as causas do autismo
corre em ritmo acelerado e nela são arrolados fatores estapafúrdios.
Fundamentalmente a preocupação de Laurent centra-se nas medidas de reeducação
dos autistas, propostos por renomados centros de investigações, que voltam a
sugerir inclusive o uso de eletrochoque como medida punitiva a comportamentos
indesejáveis.
Cinthia Busato utiliza exemplos clínicos para
situar a diferença da direção do tratamento entre psicanálise e psicoterapia,
destacando que uma das premissas fundamentais da psicanálise é que o saber está
do lado do analisante, e a se contruir. Em contra partida, na psicoterapia,
argumenta que o saber está do lado do terapeuta e é da ordem do universal.
Os artigos de Fabian Fajnwaks e de Jussara Jovita
estão inseridos na seção Corpo.
Fabian através do texto Gêneros Lacanianos, desconstrói os argumentos de diversos autores
dos estudos de gêneros, que buscam evidenciar a herança falocêntrica dos textos
lacanianos e da prática moralista da psicanálise. Através de interessante caso
clínico, o autor mostra a presença do heteros
numa relação homossexual, para exemplificar que “é a psicanálise que
desnaturaliza e deseterossexualiza o desejo”, “[...] e que o outro Gozo que Lacan formula é, em si,
uma crítica ao falocentrismo freudiano e uma subversão”.
Jussara Jovita problematiza as questões
referentes à transexualidade, apontando para a importância de despatologizar as
demandas desses sujeitos e, fundamentalmente, a autora traz à luz o importante
debate que visa afastar a relação estrita entre transexualidade e psicose.
Na seção passe, dois AE nos trazem suas
elaborações.
Silvia Salman (AE da AMP/EOL) transmite, em seu texto-testemunho, a experiência de
esvaziamento de gozo obtido a partir do analisado em sua experiência,
evidenciando: a) como a interpretação - emoldurada no dizer, no silêncio ou no
ato do analista - pode ser eficaz somente quando o analisante agrega ali algo
de seu; e b) como o esvaziamento da consistência do gozo, liberado da
subordinação fantasmática, permite um saber-fazer-aí com o sintoma, traçando
"outra borda entre o padecimento e o funcionamento".
Gustavo Stiglitz (AE da AMP/EOL) centra seu testemunho a partir de uma questão que
lhe foi endereçada - Por que falar,
ainda? O simbólico no século XXI - e submete sua resposta à articulação do
que foi, para ele, a marca do encontro com lalíngua do Outro e a marca do
encontro da linguagem com a sexualidade. Essas marcas, ao serem tratadas em
análise, podem produzir novos efeitos na posição analisante, no desejo do
analista que advém e no exercício do AE: falamos porque somos, enquanto seres
falantes, resposta do real; falamos porque nos toca esse gozo que ex-siste ao
significante, o gozo feminino. E, por isso mesmo, "fala-se não tudo e não
todo o tempo". Oscar Reymundo e Silvia Emilia Esposito tecem, na
sequência, alguns comentários sobre o texto-testemunho de Stiglitz.
Três autores compõem a seção mulher, mãe, feminino.
Silvia Elena Tendlarz faz um percurso expetacular
pela obra lacaniana para situar as complexas imbricações, na relação entre os
sexos, entre o amor, o desejo e o gozo. Demonstra, com o rigor de um saber
fundado na prática clínica, como um casal libidinal só se sustenta ao tocar o
mais singular de cada um, colocando em evidencia que a relação que as mulheres
mantém com o amor se situa entre semblante e sintoma.
Ruskaya Rodrigues Maia discute os efeitos
devastadores que podem incidir na parceria amorosa, uma vez que a primeira
parceria dos seres falantes acontece no encontro com o Desejo da Mãe, desejo
onde transborda o inominável do gozo da mulher que não existe (A/).
Ana Martha Maia trabalha detidamente a posição
feminina de gozo e suas relações com o amor, para tocar o tema da melancolia
feminina, fazendo uma articulação com a neurose obsessiva na mulher.
Na seção clínica, temos:
Virgínio Baio, quem nos oferece uma contribuição
ímpar a partir do fragmento de um caso clínico, numa prática "entre
vários", com uma criança autista. Virginio Baio nos dá uma verdadeira
lição dessa clínica, na qual é preciso que nos situemos entre duas posições
problemáticas: a de uma evitação (que não nos ocupemos de nos fazer escutar
porque isso produz o contrário) e a de uma necessidade (temos que dizer algo).
Disso decorre uma indicação precisa, para que façamos uso de uma fala que não
provoque estragos e se preste à operação do sujeito dito autista: a condição de
nos mostrarmos regulados e de nos regularmos por suas construções e/ou signos
do seu próprio modo de tratar o encontro com seu Outro louco.
E Mariana Zelis, que em seu texto sobre a clínica
com crianças, discorre sobre pontos fundamentais para dar um tratamento aos
medos e angústias infantis, propondo uma correspondência do medo com o acting
out e da angústia com a passagem ao ato.
Por fim, na seção e fica o o significante,
apresentamos uma pequena elaboração, de Vanessa Nahas, em que procura, em uma
instituição de saúde, uma via de abertura à construção de um saber que
desnaturalize - como em geral é o caso nessas instituições - o saber sobre o sexual.
por Laureci Nunes e Liège Goulart
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