domingo, 9 de outubro de 2011

Medo de criança ou medo da criança?

Ao ouvir um comentário sobre o crescente número de crianças que são duplamente abandonadas, por seus pais e pelo Estado, surpreendeu-me o seguinte: quem dizia do horror que a situação de abandono das crianças lhe despertava deixava-me em dúvida sobre o que era realmente o horror: o medo
que essa pessoa tinha de crianças que se apresentavam violentas, como até então não se havia imaginado, ou se essa pessoa fazia referência ao medo das crianças diante de uma realidade tão aterradora para elas.
As duas possibilidades soaram-me possíveis e pareceram-me igualmente aterradoras para as crianças. Nas duas situações a criança é colocada em posição de ter que precocemente arcar com o peso de sua inserção no mundo dito adulto, isto é, ter que haver com o desejo, dela e muitas vezes o de seus pais também.
A característica inerentemente humana, que nos diferencia dos animais é que todos estamos submetidos a um trauma inicial que marca a nossa entrada na civilização humana, a entrada na linguagem. Porém esta entrada não garante a um sujeito a posse do discurso, isto é, o laço social que a linguagem proporciona àqueles que dela podem se servir. O desejo é inoculado no filhote humano quando de sua entrada na linguagem, estando este ainda incompleto em sua maturação biológica. Ele nasce totalmente dependente de alguém que signifique seus apelos, seja para apaziguar a fome, aquecê-lo, mantê-lo limpo ou ainda acalentá-lo. O bebê certamente depende desses cuidados para sua sobrevivência, mas mais importante ainda para sua inserção na comunidade humana é a sua inscrição simbólica, que o antecede em sua chegada ao mundo, reservando-lhe um lugar propriamente seu. 
A psicanálise propõe como estratégia que se contrapõe à universalização do real que se dissemina cada vez mais em nossos dias, a vivificação do simbólico que particulariza a fala do um por um, apostando na invenção de gozos singulares para fazer barreira ao gozo autístico que o imperativo da Ciência e da Tecnologia produz.
Para discutir questões que dizem respeito às crianças e adolescentes, o Núcleo Pandorga de Pesquisa da Clínica Psicanalítica com Crianças convida para a conferência de Phillipe Lacadée, na abertura das atividades da Jornada EBP/SC.


Local: Hotel Valerim Plaza, rua Felipe Schmidt, 705, Centro. Dia 26, às 19h30. Valor R$ 40,00.


Marise Pinto
Psicanalista, integrante do "Núcleo Pandorga" EBP/SC.

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