quinta-feira, 28 de agosto de 2008

Grupo Psicanálise e Cultura: do mal-estar à sublimação

Retomamos neste segundo semestre nossas discussões em torno da leitura do Seminário 7, no qual Lacan vem falar-nos no que implica levar em consideração o desejo. E indaga sobre como seria uma sociedade em que o homem ousasse arriscar a morte para não morrer seu desejo. Neste Seminário, aborda os temas da ética e da sublimação, e discorre em torno de qual satisfação possível para o homem, já que a satisfação completa é impossível. O que encobriria todas as faltas, das Ding, a Coisa, esse objeto é, desde sempre, objeto perdido. Assim, o que cada homem pode fazer para isso que sempre falta?
A psicanálise fala das possibilidades para a satisfação (da pulsão):
_ nos tempos de Freud, de uma sociedade que ao mesmo tempo em que obstaculiza a sexualidade, engendra uma estranha forma de satisfação a partir dos sintomas, da culpa e das exigências do superego. Tempos de uma sociedade repressora que a própria psicanálise ajudou a derrubar, ao desfazer os ideais de harmonia, de ordenação, de maturidade da sexualidade, já que a condição do humano é de ser dividido pelos desejos inconscientes.
_ nos tempos atuais, de um apelo a um gozo desmedido, ilimitado, a uma curtição sem limites e sem lei. O preço pago por isso pode ser a falta de desejo, a intolerância ao outro, que pode chegar às raias da destruição.
_ outra saída para a satisfação, apresentada por Freud e discutida neste Seminário, é a sublimação. Uma saída que não é nem pela via da repressão, nem por uma satisfação direta da pulsão que poria em risco a sociedade. Ao contrário, é uma saída socialmente valorizada.
Criar é fazer algo, não que tampone a falta, mas justamente com ela. Como um poteiro, que ao fazer o pote, o faz em torno de um vazio.

Então, convidamos a quem queira juntar-se a nós nessas pesquisas para a reunião do dia 2, onde conversaremos em torno do Seminário 7, A ética da Psicanálise, mais propriamente o capítulo XXII, intitulado “A demanda de felicidade e a promessa analítica”. Até lá.

Coordenadora: Soraya Santos valerim

terça-feira, 26 de agosto de 2008

Entrevista Estúdio 36, da TVCOM

O programa Estúdio 36, da TVCOM, recebe nesta quarta-feira, dia 27, a psicanalista-membro da EBP, Vanessa Nahas, e o antropólogo Rogério Azize, doutorando em antropologia do Museu Nacional do Rio de Janeiro. Eles estarão no programa para divulgar as atividades preparatórias da III Jornada da EBP em SC – “Felicidade Pronta-Entrega: Felizes a Qualquer Preço?”. Rogério Azize participa, na quinta-feira, da atividade “Biblioteca e Intercâmbio Convidam”, para falar sobre a popularização do discurso neurocientífico, tema de um de seus estudos. O Estúdio 36 começa às 20h30 e é reprisado na quinta, às 16h.

Mais sobre o Estúdio 36: o programa prioriza a cultura. Está no ar há oito anos, desde a estréia da TVCOM, e tem uma hora de duração. Há dois anos é apresentado pela jornalista Camila Olivo.

segunda-feira, 25 de agosto de 2008

Entrevista com Marcus André Vieira - EBP/AMP sobre a felicidade


1- Para Freud a felicidade é uma ilusão. Lacan afirma que ao nível da pulsão o sujeito é feliz. O que você pode nos dizer sobre essas perspectivas?
Freud se endereça aos leigos, à multidão, Lacan para aqueles que formou. Os primeiros partem da idéia de uma felicidade permanente, como o paraíso, os segundos descobrem que uma análise não precisa ser triste, ainda mais se nos abre para a surpresa.
2- Quais as respostas contemporâneas que a civilização tem oferecido para as dores do existir?
Depois dos bons tempos de sexo, drogas e rock and roll, ela agora parece apostar mais em Big brother, lucro e autoestima.
3- Qual o preço que se paga pela demanda de ser feliz o tempo todo?
Ninguém quer ser feliz o tempo todo, se alguém pede isso ou está se enganando ou desenganado demais para viver.
4- O que a psicanálise pode oferecer para o tratamento do mal-estar?
A certeza de se estar vivo.

sexta-feira, 22 de agosto de 2008

Entrevista: Iordan Gurgel, AME da EBP e AMP, presidente da Escola Brasileira de Psicanálise, sobre a felicidade




1- Para Freud a felicidade é uma ilusão. Lacan afirma que ao nível da pulsão o sujeito é feliz. O que você pode nos dizer sobre essas perspectivas?
Para Freud a felicidade não estaria no plano da “Criação”; ela é sempre episódica e restringida por nossa própria constituição. Como a pulsão é sempre constante e sua finalidade é a satisfação, neste nível, o sujeito é feliz – a satisfação da pulsão equivale à felicidade. Mas, em Televisão, na Introdução à edição alemã de um primeiro volume dos Escritos e no Auto-comentário, Lacan diz que existe o feliz acaso [bom heur], o que caracterizaria a felicidade como fortuita. Apesar de não haver a relação sexual há encontro entre os seres sexuados; e assim os “seres” falantes são felizes por natureza – esta é a condição de sua reprodução. Eis o encontro de Lacan com Freud, que considerou o amor sexual um modelo para a busca da felicidade.

2- Quais as respostas contemporâneas que a civilização tem oferecido para as dores do existir?
Freud dá indicação das três fontes de que nosso sofrimento provém: o poder superior da natureza, a fragilidade de nossos próprios corpos e a inadequação das regras que procuram ajustar os relacionamentos mútuos dos seres humanos na família, no Estado e na sociedade. Mas, os métodos para evitar o sofrimento podem ocasionar também o mal-estar: o químico (as drogas e medicamentos); a renúncia pulsional; a reorientação dos objetivos pulsionais – a sublimação; a rejeição da realidade e o amor. As ofertas da religião, das ciências e do mercado de consumo têm fracassado neste mister.

3- Qual o preço que se paga pela demanda de ser feliz o tempo todo?
Freud dizia que "o desígnio de ser feliz que nos impõe o Princípio do Prazer é irrealizável, mas não por isto deve-se abandonar os esforços de aproximar-se de qualquer modo a sua realização". A política imposta pela sociedade contemporânea levou ao pé da letra a esperança de Freud e a crença da felicidade aliou-se à lógica do consumo. Consumir seria um recurso do sujeito de promover todo objeto que lhe apareça à categoria de substituto do objeto perdido e assim, ser feliz. Esta nostalgia do objeto perdido e o que ele encontra, não coincidem com o que procura – aí teríamos um correlato à frustração. Ele se equivoca ao pensar que é feliz na medida em que goza de todos os objetos que podem lhe fazer gozar. É o preço a pagar.

4- O que a psicanálise pode oferecer para o tratamento do mal-estar?
A felicidade, no reduzido sentido em que a reconhecemos como possível, constitui um problema da economia da libido do indivíduo. Não existe uma regra de ouro que se aplique a todos: o homem tem de descobrir por si mesmo de que modo específico ele pode ser salvo – dizia Freud.
A psicanálise não pretende dar respostas completas ao homem sobre como satisfazer seus desejos e ser feliz, e sim acompanhá-lo neste percurso, ajudando-o a reconhecer a singularidade de seu sinthoma e as conseqüências daí advindas. E assim, contribuir para que, àqueles que demandem atendimento, possam, via a arte de falar, se sublevarem, assumir a sua verdade e ir mais além de seu mal-estar. Eis, como disse J.A.Miller, o anti-depressivo mais potente!

segunda-feira, 11 de agosto de 2008

ARTEIRA


Em 12 de setembro próximo, por ocasião da III Jornada, a Seção SC (e-f) da EBP lançará o primeiro número de “arteira” – Revista de Psicanálise.
Seis Seções agrupam os textos deste número:
- Em Política Lacaniana, trata-se de abordar a posição da psicanálise no mundo contemporâneo; a posição dos analistas, em relação às instituições e ao Outro Social, marcada profundamente pela concepção do tratamento e pelos próprios princípios da psicanálise; e a questão da formação dos analistas, situando a ética, a construção e a clínica lacanianas no registro da política.
- Em Psicanálise e Felicidade - tema que está colocado em debate, atualmente, no interior do Campo Freudiano -, encontram-se elaborações que buscam demarcar as diferenças entre os discursos contemporâneos e o discurso analítico. Assim, faz-se um contraponto entre a felicidade que, mais do que como um ideal, aparece como um imperativo - que não deixa de incluir os artefatos da ciência e de engendrar, inclusive, políticas públicas que visem eliminar os impasses próprios do estar no mundo - e a felicidade, na perspectiva da psicanálise, que leva em conta a existência do real, sem lei, e que, portanto, não apontando saídas generalizáveis, só pode apostar na saída do ‘um a um’, em invenções, sem garantias, ante o particular do desejo e a singularidade da satisfação sintomática.
- Em Peças Avulsas, fazendo uso do título de um dos recentes cursos da Orientação Lacaniana – proferido por Jacques-Alain Miller -, reúnem-se textos onde questões clínicas e teóricas - gozo, objeto, desejo, angústia, amor, o feminino, sintomas contemporâneos, etc. - abordam os limites do desejo, o arrebatamento do gozo, as possibilidades sintomáticas e o fazer do analista na direção do tratamento.
- Em Clínica Borromeana e Passe, os artigos abordam, desde diferentes ângulos, o final de análise e o passe, a partir da segunda clínica de Jacques Lacan, percorrendo o fio que une a questão do fim de análise à concepção do inconsciente, da interpretação - quando o Outro não existe -, do ato analítico, das vicissitudes do objeto a e da lógica do não-toda.
- Em Conexões, uma vez que a psicanálise sempre dialogou com outros saberes (Antropologia, Filosofia, Literatura, Direito, Medicina, Artes Plásticas, etc.), dos quais soube extrair os ensinamentos que melhor lhe permitiram situar, no horizonte, a subjetividade de sua época, neste número, a Literatura é nossa interlocutora.
- Em Centro Psicanalítico de Consulta e Tratamento (CPCT), apresenta-se, em um caso clínico, uma política que articula a psicanálise aplicada à terapêutica e a força viva do desejo do analista.

Liège Goulart - EBP-SC (em formação)

terça-feira, 5 de agosto de 2008

A Felicidade é o remédio?


A felicidade no mundo contemporâneo transformou-se em imperativo. Vivemos o tempo em que o ideal de felicidade e de qualidade de vida roubou a cena e chegou à proporções tais que, facilmente poderíamos, junto com Lipovetsky, denominar de “felicidade despótica” ou de “tirania da Felicidade”(1).
É nesse cenário que o consumo da medicação, testemunho da aliança da medicina com o mercado, encontra terreno fértil sobre o qual proliferar, respondendo à crença da conquista da felicidade através da psicofarmacologia. A psiquiatria promete ao mundo a cura para os sofrimentos psíquicos e populariza a utilização de drogas que, por exemplo, no caso da depressão, propõe eliminar do sujeito o sentimento de fracasso por não pertencer ao mundo dos homens felizes.
Essa é a ideologia que convence e que permite estabelecer os argumentos necessários à administração dos antidepressivos. Em 2007, Juan Pundik Knapheis, psicanalista em Madrid, inicia uma campanha de combate à legalização da administração de medicamentos antidepressivos para as crianças, que ficou conhecida como PLATAFORMA CONTRA A MEDICALIZAÇÃO DA INFÂNCIA. Ela se opõe particularmente à autorização da prescrição de Prozac para menores de 18 anos, autorização que foi solicitada por seu fabricante à Agência Européia do medicamento e obteve o parecer favorável.
“Inúmeros estudos e investigações publicadas nesses últimos anos estabelecem que a enorme argumentação de utilização de antidepressivos, elevando o nível de serotonina, com freqüência prescritos associados a outros medicamentos os quais, por sua vez, também elevam esse nível, constitui uma ameaça para a saúde e a vida do paciente. A Comissão Européia não tomou conhecimento disso, dando como válido apenas o relatório do laboratório fabricante. Concede-se aos profissionais médicos a autorização de decidir quais de nossas idéias ou condutas devem ser escritas, diagnosticadas, tratadas, medicadas e até mesmo drogadas com a aprovação da Comissão Européia” (2). Segundo Pundik há uma espécie de estado totalitário que pretende classificar crianças e jovens como angustiados, fóbicos, depressivos, atacados de pânico, bipolares, etc., submetendo-os a medicamentos que segregam e apagam os direitos e liberdades individuais. Tal fato se deve à negligência e voracidade da indústria farmacêutica, aliadas aos pesquisadores ansiosos em promover suas últimas descobertas, enfatizando os benefícios da medicação em detrimento de seus riscos. Os efeitos secundários não só podem ocorrer como de fato ocorrem.
Thomas Szasz, professor emérito de psiquiatria e membro vitalício da Associação Psiquiátrica Americana (APA) diz: “Nenhuma conduta, nem má conduta é uma enfermidade, nem pode ser uma enfermidade. Isso não é o que são as enfermidades. As enfermidades são disfunções do corpo humano, do coração, do fígado, etc. Por isso devem poder ser diagnosticadas por médicos e análises objetivas. Quando a criança vai ao doutor e lhe tiram muito sangue e raio X, ele não quer saber como se comporta. O etiquetar a criança como enferma mental é estigmatização, não diagnóstico. O dar à criança uma droga psiquiátrica é envenenamento, não tratamento”(3).
O psicanalista, na cotidianidade de sua clínica, pode extrair diversas conseqüências dessa tendência à medicalização da felicidade que promete ser globalizada e que, como vimos, visa estender-se também às crianças. Quando a felicidade torna-se uma questão de necessidade e urgência e “as maiores esperanças são depositadas nos progressos da ciência”, o que se mostra no horizonte é um completo apagamento do sujeito que é decorrente de sua impossibilidade de fazer uso da palavra e de seus efeitos, principalmente de seus tropeços.

1- LIPOVETSKY, Gilles. A Felicidade Paradoxal – Ensaio Sobre a Sociedade de Hiperconsumo.Companhia das Letras. São Paulo, 2007.
2- PUNDIK, Juan. AMP-UQBAR-LNA: Plate Forme Contre la Médicalisation de l’enfance. Le Nouvel Âne, nº 7. Outubro, 2007. “Juan Pundik, que é psicanalista em Madrid, continua seu combate contra a medicalização da infância. Ele se opõe particularmente à autorização da prescrição de Prozac para os menores de 18 anos. Pode-se apoiar sua ação escrevendo-lhe para o seguinte endereço: filium@arrakis.es”
3- http://es.youtube.com/watch. Dr. Thomas Szasz. Fevereiro,2007.


Eneida Santos Medeiros - responsável pelo Núcleo de Investigação e Pesquisa da Psicanálise com Crianças - EBP-SC (em formação)