domingo, 7 de novembro de 2010

Invenção do comtemporâneo

Neste mês de novembro a TV Cultura exibirá a série Invenção do Contemporâneo "A psicanálise do Século XXI: Lacan para desesperados da crise", promovida pela CPFL Cultura, sob a curadoria de Jorge Forbes:

09/11 - à 1h de segunda para terça-feira - Joel Birman - Novas subjetivações e o mal estar na contemporaneidade.

16/11 – à 1h de segunda para terça-feira - Alain Grosrichard – Mal estar na globalização: Lacan e as luzes.

23/11 – à 1h de segunda para terça-feira - Jorge Forbes - Jacques Lacan e a psicanálise do Século XXI.

30/11 – à 1h de segunda para terça-feira - REPRISE - Alain Grosrichard – Mal estar na globalização: Lacan e as luzes.
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quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Bem-vindos à Jornada!

Caros colegas e amigos, participantes da V Jornada da Seção Santa Catarina da Escola Brasileira de Psicanálise - Somos Todos Loucos?


Sejam muito bem-vindos e bem-vindas!

Além do trabalho que nos espera nessa V Jornada, esperamos compartilhar com vocês também boas conversas e momentos de alegria e comemoração.  

Para os que vêm de fora, reunimos algumas informações que poderão ser úteis para que aproveitem melhor sua estadia na nossa bela cidade.


Além das belezas naturais, Florianópolis oferece hoje diversas opções de lazer e gastronomia. Selecionamos apenas algumas sugestões, mas indicamos também onde poderão encontrar mais informações on-line e também os nossos telefones pessoais.


O local de realização do evento, por si só, já é uma ótima opção de lazer, pois oferece uma das mais belas vistas da Ilha, com um belíssimo por-do-sol. Pela previsão do tempo até o momento em que escrevemos esta, não teremos chuva nem na sexta-feira, nem no domingo (sábado ainda é uma incógnita...). Portanto, as chances de belos dias e belas noites são altas.

Santo Antônio de Lisboa, é um bairro vizinho de Cacupé, moradia de vários artistas e artesãos, uma boa pedida dia e noite, com diversas opções de restaurantes e bares à beira d’água.  Uma boa dica é passear por ali no domingo e conhecer a produção local de arte e artesanato. No entanto, os restaurantes em geral fecham a cozinha às 23:00 hs. Jantar após esse horário pode ser um problema, é sempre melhor telefonar antes. Os bares continuam até tarde.  

No Centro da cidade – especialmente na avenida Beira-Mar Norte e proximidades - e em diversos outros bairros também há boas opções de gastronomia e lazer.

Boa Jornada!

Comissão de Acolhimento
Gresiela Nunes da Rosa – (48) 8404 1567
Jussara Bado – (48) 9128 4456
Laureci Nunes – (48) 99822107
Louise Lhullier – (48) 9983-4882
Patrícia Boeing –(48) 9981 6960


Onde comer

No próprio SESC Cacupé

A cozinha é simples, mas o cardápio é diversificado contendo: 4 tipos de carne, aproximadamente 12 tipos de saladas, 14 tipos de acompanhamentos. As opções variam todos os dias.
Os jantares são servidos no horário das 19:00 as 21:00 horas. Para os hóspedes é buffet livre com sobremesa, sendo incluso na diária.
Para os visitantes: buffet a quilo, sendo R$ 15,00/kg. para comerciários e R$ 22,00/kg. para não comerciários.

Bons restaurantes de frutos do mar em Cacupé e Santo Antônio de Lisboa, com vista para o mar:

Em Cacupé

Zé do Cacupé
Cozinha típica da Ilha e especialidades da casa.
Informações no site www.zedocacupe.com.br.
Fone: (48) 3335-6229

João de Barro 
Serve também massas caseiras, carnes, fondue (inverno).
Fone: (48) 3335-6003
  
Em Santo Antônio de Lisboa

Marisqueria Sintra
Comida portuguesa especializada em frutos do mar.
Fone: (48) 3234-4219

Chão Batido
Cozinha típica da Ilha e especialidades da casa.
Fone: (48) 3235-6003 / (48) 3235-2186

Outras boas opções

Spaghetteria Santo Antônio – em santo Antônio de Lisboa - http://santaspaghetteria.blogspot.com/
Fone: (48) 3235-2356

Pizzaria Lorenzo’s – em Cacupé – ao lado do restaurante João de Barro (a mesma família é proprietária de ambos).
Fone: (48) 3335-6555

Restaurante Chefe Fedoca – Lagoa da Conceição
Fone: (48) 3232-0759

Ostradamus Restaurante – Ribeirão da Ilha
Fone: (48) 3337-5711

Ostra da Ilha – Ribeirão da Ilha
Fone: (48) 3337-0950



Brinde e Lançamento da Revista arteira no. 3

Dia 29 de outubro, sexta-feira, às 21hs.30min.
Local: SESC Cacupé


Festa de Confraternização da V Jornada da Seção Santa Catarina

Dia 30 de outubro, sábado, a partir das 21hs.30min.
Local: Essencial Choperia e Petisqueria
Rodovia SC 401, 9090.
Km 09 - Trevo de Santo Antônio de Lisboa
Santo Antônio de Lisboa - Florianópolis - SC
Fone: 3238-9386
Show com Jason Dias (samba de raiz)

Obs: O local disponibiliza estacionamento próprio com segurança.

Para mais diversão e arte, especialmente para quem vai ficar mais alguns dias, sugerimos visitar alguns sites que oferecem opções para todos os gostos, de exposições a esportes de aventura:



Transporte

A distância do aeroporto de Florianópolis à Cacupé é de 25 km, e do Centro da cidade até Cacupé é de 15 km.
Para pegar um táxi, pode-se fazer o pedido antecipado através do site: http://www.floripataxi.com/website/index.php ou pelo telefone 48 8426 3635, com Mário.
Também é possível usar o Radio táxi: 3240 6009

Telefones Úteis
  • Aeroporto Internacional Hercílio Luz (48) 3331 4000
  • Terminal Rodoviário Rita Maria (48) 3212 3100
  • Pronto Socorro 192
  • Transporte Urbano 1517
  • Auxílio à Lista Telefônica 102
  • Farmácia do Sesi Tele-entrega: 0800- 6480800


Programação da Jornada

ESTAMOS TODOS LOUCOS?

Provavelmente muitos de nós nos fazemos esta pergunta, quando somos atravessados por uma série de situações que se colocam no nosso cotidiano principalmente através dos noticiários de televisão. Hoje, assistimos absortos às mais diversas manifestações de algo que foge àquilo que até pouco tempo era, para nós, uma referência mínima em termos de como se estabeleciam certas formas de convivência. Dentre elas podemos citar as relações entre pais e filhos, entre professores e alunos, entre colegas de sala de aula e a relação com a própria vida. Esta última, então, se banalizou, a tal ponto que, para se matar alguém, basta uma simples briga entre namorados. Não faz muito que isto se resolvia, em grande parte dos vezes, com um ombro amigo no qual se podia chorar, por exemplo. O que nos aconteceu, então, que assistimos, nos dias atuais, a uma série de atrocidades, em escala nunca antes vista, em todos os campos da vida social? Na psicanálise da Orientação Lacaniana, atribuímos esses fenômenos ao que chamamos da “ queda do pai” , ou seja, a queda de um pólo organizador central que até então guiava nossas vidas. Jacques Lacan, psicanalista francês, que muito soube refletir sobre os tempos em que vivemos, caracteriza o momento atual da história como o de uma ordem social que se sustenta sem esse pólo organizador, de modo que a ausência dele dá lugar ao surgimento de uma ordem de ferro que é princípio de loucura para a subjetividade. Trocando em miúdos, estamos hoje sujeitos a um imperativo de “ satisfação a qualquer preço” e sem limites. O uso de drogas, talvez, seja um dos exemplos mais flagrantes disto, mas também o consumo desenfreado de objetos, a compulsão por jogos, as anorexias, as bulimias etc., são diferentes formas de manifestações ligadas a essa mesma questão. 

“ Somos todos Loucos?” , é também uma pergunta, e é o título da V Jornada da Seção SC da Escola Brasileira de Psicanálise. Será que há alguma relação entre este título e o que antes foi colocado sobre a queda do pai e as manifestações relativas a esta queda? Podemos dizer que sim, que ele se refere ao fato, justamente, de que todos nós estamos sujeitos, sejamos ou não psicóticos, os ditos loucos, a uma mesma questão, qual seja: como nos virarmos sem este pólo organizador central que até então guiava a vida da grande maioria de nós? “ Todos loucos, delirantes” é a provocativa fórmula do psicanalista francês, Jacques Lacan, já referido, que inspirou nosso título. Esta fórmula refere-se ao fato a de que todos nós nos deparamos com a impossibilidade de a tudo dar um sentido e, frente a isto, temos que fazer algo que é da ordem de uma invenção. Este fazer algo sempre é singular, sempre é ao modo de cada um. É isto que em psicanálise vai se chamar sintoma. O sintoma é a verdade de cada um. Pensar que o sintoma á a verdade de cada um implica em admitir que haja algo de incurável nele, no sintoma, e é com este incurável que temos que saber fazer. Nestes termos podemos dizer, "não há saúde mental” , “ somos todos loucos” . 

Talvez, neste sentido, a psicose tenha muito a nos ensinar, pois nela se torna evidente a necessidade de o sujeito constituir um sintoma, uma ficção para fazer frente às invasões que ele experimenta, por exemplo, as vozes que escuta. Na psicose isto é mais evidente, porque muitas vezes o sujeito não pôde ainda, inventar uma ficção, como a maioria de nós o fez, ou a que ele tinha ruiu. Talvez esta seja, então, a diferença entre a psicose e o que chamamos no Campo Freudiano a “ loucura generalizada” , pois nesta última o sujeito fez uma ficção, na psicose trata-se, muitas vezes, da necessidade de constituí-la. Mas, se se trata da necessidade de todos construírem uma ficção, neste nível podemos dizer “ todos loucos, delirantes” . 

Essas questões e muitas outras estarão no centro do debate da V Jornada da Seção Santa Catarina da Escola Brasileira de Psicanálise, com o tema Somos todos loucos? Que acontecerá nos dias 29 e 30 de outubro de 2010, no Centro de Eventos Sesc Cacupé, Rodovia Haroldo Soares Galvan, 1670, Florianópolis. O evento contará com a participação da psicanalista, Esthela Solano Suarez, professora da Universidade Paris VIII e membro da École de la Cause Freudienne/França. Ela fará o seminário “ O avesso do elogio da loucura” . Terá ainda, a Conferência “ O Sintoma na clínica do delírio generalizado” , com o Presidente da Escola Brasileira de Psicanálise, Antônio Beneti e o testemunho de final de análise do Analista da Escola (AE), Sérgio Passos Ribeiro de Campos e as mesas “ Verdade e loucura” e “ Clínica do delírio generalizado. 


Maria Teresa Wendhausen é Psicanalista, Membro da Escola Brasileira de Psicanálise e da Associação Mundial de Psicanálise

Freud cabe no bolso?

Na capa do livro de bolso lançado este ano pela L&PM, um senhor de barba branca, cabelo ralo, olhos meigos, e seu inseparável charuto. Este senhor é Freud e a obra é O mal-estar na cultura, escrita por ele em 1929, já quando estava com 73 anos. 

Se poucos de seus contemporâneos puderam alcançar a análise aguda da sociedade que Freud estava fazendo naquela época, no período entre-guerras, o que esta obra teria a nos dizer hoje, sobre o mundo de 2010? 

É no só-depois, transcorrido algumas décadas e com a preciosa ajuda de Lacan, que podemos ler a análise que vai ao âmago do sofrimento do homem civilizado, que tem que pagar o preço do progresso cultural com déficit de felicidade. Este é um ensaio que fala da angústia e da dor por sabermos ser impotentes frente às forças da natureza, por sabermos ser mortais e por termos que irremediavelmente precisar do outro. Outro que serve para nossa satisfação sexual, como companheiro na luta por sobreviver, mas também aquele com o qual rivalizamos e sobre o qual gostaríamos de exercer nosso poder e domínio. 

O ensaio consta de 8 capítulos. Inicia discutindo a religião como uma construção humana para dar conta do desamparo no qual estamos mergulhados. Desamparo diante do qual concebemos um pai todo-poderoso. Um Deus, não à imagem dos homens, mas um Deus à imagem de um pai que atende à nossa ilusão de que haveria alguém não fosse impotente como nós. 

Segue o livro apresentando-nos o que seria uma programação do homem: o programa do principio do prazer, segundo o qual as nossas ações visariam obter o prazer e evitar o desprazer. E constata que é um programa condenado a falhar, pois sua execução seria a eliminação de toda tensão, o que, em última instância, seria o aniquilamento do homem, seria a própria morte. A realização do programa da cultura implica na não-realização do programa do principio do prazer. 

A grande questão, o intrigante e que causou impacto entre seus contemporâneos é que temos atitudes e pensamentos que não estão a serviço de obter prazer: masoquismo, submissão, repetição de situações desprazerosas, o recuo diante da iminência de realização de um projeto ambicionado, Sobre isso, Freud dirá que está para além do principio do prazer, denominando pulsão de morte. Essa é a pedra no meio do caminho com a qual se deparou em 1920 e que implicou em uma releitura de toda a sua obra produzida até então. Aqui, em O mal estar na cultura, Freud apresenta para o público a análise da sociedade, do processo de civilização, à luz desse novo olhar sobre o homem. 

Seguindo a linha de questionar a suposição de que o sentido da vida seria perseguir a felicidade, Freud analisa que todo o poder que o homem foi adquirindo, tornou-nos verdadeiros deuses de prótese, tamanho os artifícios que fabricamos para nos dar mais potência, mas não nos trouxe mais felicidade. Talvez até o contrário, pois nossa capacidade de nos destruir não cessa de ameaçar. 

Nesta obra está presente a equivalência que Freud costuma fazer entre o processo de desenvolvimento da cultura e o de cada sujeito. Desde o momento, mítico, em que se formou a humanidade a partir da união dos irmãos para despojarem um tirano detentor de todo poder e de todas as mulheres. E em cada individuo o mito do complexo de Édipo ilustra essa rivalidade e disputa com o pai, detentor da mãe - fonte de toda satisfação. É preciso renunciar à mãe, mas também destituir esse pai poderoso, e o saldo restante é a culpa. 

O mal-estar na cultura, o mal-estar que Freud encontra em cada um de nós aparece como angustia, aparece como culpa. Culpa que independe de estarmos cumprindo ou não com os ideais, com os mandatos. Inclusive, a culpa aparece paradoxalmente mais forte nos sujeitos mais dedicados a cumprir as leis e a ordem É que a culpa é a parcela de agressividade que, não podendo ser dirigida para fora, volta-se para o próprio sujeito. 

Bem, se não puder ler toda a obra, leia ao menos os capítulos II e o VII e encontre toda a força da escrita de Freud, onde ele nos mostra o encontro que teve com aquilo que não é o que gostaríamos de saber sobre nós, tão civilizados que somos. 

É um Freud que vem dizer o quanto o principio do prazer e aquele estranho além do principio do prazer estão imbricados. Que a cultura se forma a partir das forças da pulsão de vida, de Eros, agregador, mas também tem que separar os amantes e os filhos. Porque um amor sem fim seria, desculpem o trocadilho, o próprio fim. E que a forma que a cultura tem para proteger o individuo da agressividade que ele exerceria sobre os outros, ameaçando a cultura, é voltá-la para si mesmo, sob a forma de culpa. É a pulsão de morte se satisfazendo no próprio individuo. 

Enfim, é um sábio Freud falando da luta eterna entre os impulsos de amor e destruição, de vida e de morte. E que a vida, afinal, é o resultado dessa dualidade. 

Para continuarmos discutindo sobre que homem temos na atualidade, a Seção SC da Escola Brasileira de Psicanálise estará realizando em Florianópolis, dias 29 e 30 de outubro a sua V Jornada, este ano com o tema Somos todos loucos? 

Soraya Valerim - psicanalista, membro da Seção SC-EBP

Somos Todos Loucos?

Que explicação dar para este título que coloca em dúvida a saúde mental de todos e de cada um? Dizer loucos é a mesma coisa do que dizer psicóticos? Decididamente não, muito embora, afirmar que ‘somos todos loucos’ assinale que na experiência psicanalítica, isto é, no ponto mais fundamental da análise de um sujeito, são isolados elementos de uma singularidade tal que tornam esse sujeito “um fora da casinha”, da casinha dos universais, um fora de todas as classificações dos sintomas, sejam estas clássicas ou contemporâneas. É esta a ferida narcísica que a psicanálise produziu na humanidade: ter provado a radical inadequação do ser falante com relação a qualquer ideal de equilíbrio e saúde mental e ter demonstrado que para poder ter uma vida com outros o neurótico “normal”, esse que dispõe do significante do Nome-do-Pai para ordenar seu mundo, deve fazer um esforço de criatividade que responde à mesma lógica que a criação que o sujeito psicótico, que não dispõe desse significante ordenador, tem de realizar para não isolar-se e participar do laço social. “Todo mundo delira”, disse Lacan, e com esta afirmação ele assinalou que toda e qualquer relação se constrói sobre um vazio original e é da ordem de uma invenção. Da ordem de “um delírio”, podemos dizer, uma montagem de linguagem, uma ficção construída sobre um “não há relação”, isto é, não há relação que já venha dada, seja pela força dos instintos, pelo determinismo genético ou pela decisão de uma vontade superior. Para se estar no laço social o ser falante, independentemente de sua estrutura clínica, não tem como poupar-se de ter que fazer um esforço de poesia. 

A pesar das tentativas classificatórias da vida e suas vicissitudes que nos últimos tempos vem avançando no campo da assim chamada “saúde mental”, estamos todos fora da casinha do universal: a singularidade do modo que cada um tem de desfrutar da vida e de se estragar a existência assim o demonstra e essa singularidade acaba se impondo, às vezes de maneira enlouquecida e violenta, mas sempre questionando a ilusão controladora da burocracia sanitarista que sonha com uma felicidade sem fim e com um mundo ordenado de uma vez e para sempre. Fazendo contraponto com a grandiosidade das promessas do discurso neoliberal que acredita ser possível um bem-estar sem falhas e sem riscos, encontramos a crise dos saberes produzidos por esse discurso, saberes que no dia a dia da luta contra o sofrimento se mostram impotentes para poder lidar com a singularidade em jogo que se expressa em cada sintoma. Somos todos loucos, sim. Estamos todos fora da casinha do universal. Saber tratar esse singular e saber criar com ele é o grande desafio de uma sociedade democrática e da cada um dos seus cidadãos. 

Oscar Reymundo, psicanalista, membro da Escola Brasileira de Psicanálise e da Associação Mundial de Psicanálise.

Somos todos doentes?

Nos últimos anos houve um crescimento expressivo do uso de medicação no tratamento das pessoas com sofrimento psíquico, não somente para os transtornos psicóticos que, sem dúvida, requerem a ajuda da medicação, como também para muitos outros “transtornos”. Um dos exemplos mais gritantes é o de crianças diagnosticadas com transtorno de déficit de atenção e hiperatividade, as conhecidas crianças TDAH, diagnóstico absurdamente freqüente feito com crianças na idade escolar.
Na fila dos mais tratados com a medicação, em primeiro lugar estão os chamados deprimidos. Os antidepressivos mais usados, desde a fluoxetina até os de primeira linha são geralmente prescritos sem necessidade, inclusive para pessoas com leves quadros depressivos ou com dificuldades emocionais. Hoje, tristeza e depressão passaram a ser a mesma coisa. Os fenômenos clínicos só adquirem importância a partir dos efeitos que os medicamentos podem oferecer, ou seja, a medicação passou a ser o princípio organizador da clínica médica. Somado a isso, bem sabemos que o culto ao medicamento e a oferta irresistível dos laboratórios não são nada inocentes.
A medicação é muito importante em algumas patologias e em situações bem específicas, mas felizmente há outras formas de tratar as dores do existir, formas que devolvem aos sujeitos a verdade de que seus corpos lhes pertencem, formas que permitem que ele assuma os riscos, as falhas e os tropeços no seu caminho na vida. Tristezas, desânimos e perdas são processos importantes que não devem ser rebaixados a um mero rótulo classificatório. Confrontar-se com eles ainda constitui a melhor forma de aprender a sobreviver sem precisar anestesiar-se. Será que o fim de um relacionamento, a demissão de um trabalho, a perda de um ser querido e tantas outras contingências da vida precisam de uma enfermidade que as justifique? “Felicidade é também ficar triste de vez em quando”.

Eneida Medeiros Santos, psicanalista, membro da Escola Brasileira de Psicanálise e da Associação Mundial de Psicanálise.

O “sinthoma” como pivô para pensar o delírio generalizado: considerações sobre as “Conferencias porteñas”, de Jacques-Alain Miller

Com a proximidade da V Jornada da Seção Santa Catarina da Escola Brasileira de Psicanálise, tentamos dar forma a algumas idéias e conceitos que poderiam nortear nosso trabalho.
O “delírio generalizado” não diz sobre a possibilidade de sermos todos psicóticos, mas sim que a partir do momento em que Lacan introduziu sua última clínica, com as formulações dos nós borromeanos, os registros se encontram em igualdade de posição uns com outros, sem que haja qualquer tipo de domínio de um sobre outro. Isto traz, como uma das conseqüências, o fato de que não possamos mais pensar a neurose como medida de normalidade, nem a psicose como estrutura deficitária. As estruturas irão se estabelecer segundo as diferentes amarrações que cada sujeito possa vir a fazer entre os registros. Nesta nova conformação, o sinthoma vai ocupar diferentes posições segundo o momento em Lacan. Primeiramente será pensado como o quarto elemento que faria a ligação entre os registros, a modo de suplência, por exemplo: na psicose seria o que permitiria ao psicótico alcançar certa estabilização. Já no final, Lacan dirá que o sinthoma é real.  Como pensar a relação entre este sinthoma e a famosa frase “todo mundo é louco”?  Para isto vamos nos servir de algumas considerações de Miller no livro “Conferencias Porteñas”, expostas nas conferencias de Buenos Aires.
Em 1997, Miller dizia: “adeus ao significante, bem vindo o sintoma”[1]. O que queria dizer com isto? Não se trata de deixar o significante e a produção de sentido de lado, mas sim de dar o lugar que o sintoma merece, a partir dos últimos ensinos de Lacan.  Se a princípio o sintoma era a verdade, um elemento perturbador no real, no final se produz um salto que leva a considerar que o “sintoma não é uma falha no funcionamento, senão um funcionamento; e que não se opõe ao real como elemento perturbador senão que se localiza na mesma dimensão do real”. Aqui não se trata do sintoma-verdade, mas do sintoma-gozo e o sintoma-gozo não é perturbador (para Freud, neste ponto era sintônico com a personalidade); é sim um modo a mais de gozar.
Por exemplo, nos casos de psicoses, não pensamos em curar ou eliminar o sintoma, mas consideramos que é preciso fazer com que o sujeito possa se anodar a um sintoma que lhe permita sobreviver, enquanto funciona como uma suplência ao Nome-do-Pai.
A que chamamos então o “sintoma-gozo”?  Seria algo que reúne uma parte significante, decifrável e a finalidade de gozo que contém. É um aparelho significante feito para produzir gozo.
Se pensarmos no tema da jornada, esse Somos todos loucos?, poderíamos pensar no conceito de sinthoma como aquilo que reúne as estruturas psicopatológicas, consideradas já não como continentes completamente diversos, mas sim como modos diferentes em que o sujeito constitui seu sinthoma, e um modo específico e singular de amarração entre os registros e o objeto a. Todos deliramos porque o delírio é considerado como uma elucubração ao redor de um furo, um furo real. Cada um delira por si, porque a língua se inventa em cada ato de fala, como dizia Lacan. Cada um se inventa sua própria língua. Assim, não contamos com uma medida de normalidade, nem graus de patologia, pois todos, seja na psicose, na neurose ou na perversão, contamos com os nossos sintomas como máquinas significantes de produção de gozo. As diferencias encontram-se nos modos diferentes em que se estabelece esta amarração, que é sempre singular e específica a cada sujeito.
Há um delírio generalizado no sentido de que não há vida sem gozo, e porque, perante o furo no real, só nos resta delirar para poder continuar sonhando nas nossas loucuras de criação de sentido.

Laura Fangmann - Psicanalista, correspondente da EBP-SC


[1] Miller, J.A., Conferencias Porteñas, “El analista-sintoma”, pag.27. 

Verdade e loucura

Nos tempos atuais a verdade já não se sustenta, o que nos desafia a construir laços levando em consideração a variedade.
Em uma experiência de análise, vai-se de verdade em verdade, desfazendo-se de algumas e reconstruindo outras, que contemplem o modo singular de cada sujeito gozar na vida. O discurso analítico não está coordenado pelo universal; sua referência é o não-todo e não o todo.
Ele toma um a um os sujeitos. Desde Freud, que indicava a tomas cada paciente a partir do zero. Uma psicanálise que é orientada para o singular rompe com as premissas da saúde mental, da universalização, do igual para todos.
A partir do comentário de Lacan, “todo mundo é louco, isto é, delirante”, temos uma clínica que invalida a idéia de cura, de verdade, uma clínica que questiona o conceito de norma e loucura.

Soraya Valerim - Psicanalista (EBP/SC)

Clínica do delírio generalizado

Há duas vertentes que se articulam na abordagem do conceito de “Delírio Generalizado”. A primeira que situa este conceito como um efeito dos tempos de fragilização e da queda do Nome-do-Pai. A segunda que o considera como um dado de estrutura, a foraclusão generalizada, que independe da época.
A articulação, na cultura, de ambas as vertentes tem como efeito o surgimento de novos fenômenos, assim chamados de “novos sintomas’ no Campo Freudiano, que são traços de caráter assintomáticos, que se destacam pela recusa ao insconsciente e por serem refratários ao discurso psicanalítico. Sintomatizar estes novos fenômenos constitui um desafio atual da prática analítica, desafio que se conjuga no que chamamos de “Clínica do Delírio Generalizado”, uma vez que a própria oferta psicanalítica tem sido afetada por estes fenômenos que nos levam a repensar o uso que o analista faz dos semblantes nestes tempos que correm: um uso livre da nostalgia do Nome-do-Pai.
Neste sentido, a orientação da sintomatização dos “novos sintomas” nos permite articular os dois momentos do ensino de Lacan: a clínica baseada nas estruturas (neurose, perversão e psicose) e a clínica borromeana, isto é, nos permite articular o conceito clássico de sintoma com a nova concepção na que se destaca o conceito de sinthoma enquanto modo de gozo que possibilita uma forma singular de amarração do sujeito ao laço social.

Oscar Reymundo - Psicanalista (EBP/AMP)

Somos Todos Loucos?